17 abril 2014

Pesquisa sobre crescimento infantil em Acrelândia é matéria na Agência USP de Notícias



Pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP acompanharam o desenvolvimento infantil na cidade de Acrelândia, no Acre, com o objetivo de verificar os determinantes do crescimento em altura e de ganho de peso das crianças. Por meio do estudo longitudinal prospectivo foi possível constatar que, ao longo da última década, diminuiu a proporção de crianças com desnutrição, com maior chance para desenvolvimento de sobrepeso. A pesquisa é inovadora ao mostrar que fatores genéticos e ambientais e deficiências nutricionais interferem tanto no desenvolvimento como também no ganho de peso das crianças.


Crianças estão com peso normal, mas há riscos de haver excesso de ganho de peso
 
 
Os dados são da tese de doutorado Determinantes do crescimento linear e ganho de peso de crianças em Acrelândia, Estado do Acre, Amazônia Ocidental Brasileira, defendida no dia 7 de março, na FSP, pela nutricionista Bárbara Hatzlhoffer Lourenço, sob a orientação da professora Marly Augusto Cardoso, do Departamento de Nutrição.

O estudo integra um conjunto de pesquisas sobre o tema com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), por meio de auxílio à pesquisa e bolsa de doutorado direto, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Bárbara ainda recebeu bolsa acadêmica da Organização dos Estados Americanos (OEA) para realização de estágios de pesquisa no exterior.

O projeto começou em 2003 com 489 crianças menores de 5 anos moradoras da área urbana de Acrelândia. Em 2007, uma nova coleta de dados envolveu 1.225 crianças menores de 10 anos, sendo várias delas iniciantes na pesquisa. Em 2009, participaram 909 crianças, (74% da triagem anterior). Em julho de 2012, novo acompanhamento focado em participantes em idade escolar foi feito, com um total de 514 crianças (equivalente a 72% de seguimento na faixa etária desejada). Durante a pesquisa, um questionário abordando questões sociodemográficas, indicadores de saúde e frequência de consumo de determinados alimentos foi respondido pela mãe, pai ou responsável. Foi feita a medição de peso e altura das crianças, além da coleta de amostra de sangue.

Entre as conclusões do estudo, estão: quanto melhor é a condição socioeconômica da família, melhor é o crescimento da criança em altura. Quanto maior é a altura da mãe, maior será a altura do filho. Filhos das mães com sobrepeso tiveram um ganho de peso maior, em comparação àquelas com peso normal. Crianças com maior peso ao nascer (>3500 g) ganharam mais peso ao longo do tempo.


Proteína C-reativa
Outra constatação é sobre os potenciais impactos negativos para o desenvolvimento infantil gerados por problemas como a ausência de saneamento básico e a dificuldade de acesso a serviços de saúde, além da alta exposição a agentes patogênicos. Crianças mais frequentemente expostas a condições adversas, com piores condições socioeconômicas e nutricionais, e que desenvolveram um estado de inflamação de baixo grau, apresentaram níveis mais altos de proteína C-reativa no sangue, um marcador de inflamação do nosso corpo. “Percebemos que essas crianças, a partir de 5 anos de idade, ganhavam mais peso ao longo do tempo, comparadas àquelas com níveis mais baixos do marcador no organismo”, explica.


Bárbara comenta que esses resultados confirmam a hipótese de que a exposição contínua a processos inflamatórios pode, como um mecanismo subjacente, interferir no desenvolvimento da pessoa ao longo do tempo. “Esse fator pode ser especialmente importante em cenários de transição nutricional de áreas de baixa e média renda como Acrelândia, em que a população passa a ser afetada por maiores chances para excesso de peso enquanto ainda é exposta a condições estruturais inadequadas.”


Gene FTO e vitamina D
Na análise do gene FTO, associado à massa gorda e obesidade, crianças com maior predisposição genética para a obesidade ganhavam mais peso ao longo do tempo em relação àquelas que não tinham nenhum alelo de risco.


E mais: ao analisar a interação do efeito deste gene com as concentrações de vitamina D, Bárbara constatou que as crianças com níveis mais baixos dessa vitamina e com alelo de risco ganharam ainda mais peso. “Já as crianças com níveis adequados de vitamina D e com alelo de risco não tiveram ganho de peso tão significativo”, informa.
A nutricionista comenta ainda que o ganho de peso em idade escolar foi associado ao aumento dos níveis de insulina no sangue e também da resistência à insulina, fatores associados a complicações metabólicas do organismo e ao desenvolvimento de doenças crônicas.

Bárbara ressalta que o peso atual da maioria das crianças que participaram do estudo é normal, mas devido a todos os fatores aqui expostos, pode-se favorecer o ganho de peso excessivo nos próximos anos dependendo, especialmente, da adoção de hábitos alimentares e de atividade física inadequados. “Em Acrelândia predomina o consumo de alimentos processados e industrializados, com baixo consumo de vegetais frescos. É uma área de mais difícil acesso, com condições climáticas complicadas. As frutas e hortaliças ficam em sessões pequenas nos supermercados, sendo que preço em geral é alto e a qualidade é ruim”, finaliza.

Foto: Francisco Emolo / Jornal da USP

Mais informações: email barbaralourenco@usp.br